Artigo: A chuva e o lixo

Por Joaquim Dias*

Que é de conhecimento da população leonense que o Município possui muitos problemas infra-estruturais não é novidade. Não pretendo, entretanto, discorrer sobre o assunto em si, mas propor algumas reflexões sobre um problema em particular que acomete as ruas do município quando temos episódios de chuva forte e prolongada: o lixo que se acumula em valetas (principalmente) e em vias de escoamento d’água, que termina por criar verdadeiros obstáculos à vazão da própria água. Esse lixo, na maioria absoluta das vezes, tem origem doméstica e residencial e é muito fácil perceber isso.
Em razão deste fato, observamos muitas manifestações sobre a negligência do poder público municipal na questão. A principal reclamação gira em torno da questão do não-recolhimento do lixo ou da demora em fazê-lo. Isto é, espera-se que o lixo depositado em valetas, ruas, vias de escoamento d’água, terrenos baldios, etc., seja recolhido adequadamente pelo serviço municipal competente. Devemos observar também que inúmeras vezes esse lixo depositado também é entulho e não lixo doméstico.
Pois bem, qual a competência do poder público municipal neste assunto? Antes de responder, quero dizer que não sou funcionário ou CC da Prefeitura Municipal, ou possuo algum tipo de ligação com o governo municipal para ponderar aqui aquilo que pretendo. Mas acredito na máxima “Dai a César, o que é de César”. Por isso, vamos lá: a competência é multar pesadamente o gerador do lixo. Recolher o lixo se necessário for, mas multar o seu gerador sem espaço para dúvidas.
Não quero que os leitores me tomem como radical, mas não é possível que a legislação brasileira sobre resíduos sólidos (lixo) ou mesmo a legislação de milhares de cidades do Brasil esteja errada e a visão deturpada de alguns moradores do Capão do Leão esteja correta. Na verdade, eu não culpo totalmente estes moradores, pois foram acostumados mal desde a emancipação, pois os diversos governos municipais e os respectivos serviços de limpeza pública cumpriram ao longo dos anos tarefas que não são sua imediata competência. Tarefas como recolher lixo fora do ponto tradicional de coleta (frente da residência) ou recolher entulho (independente se está em frente a residência ou não). Mas a verdade é simples: a prefeitura municipal (seja de que governo for!) não é responsável pelo lixo colocado fora do ponto de coleta e menos responsável ainda por entulho. Esse mesmo lixo ou entulho que obstrui qualquer tipo de sistema de vazão d’água quando temos episódios de chuva prolongada – como foi aquele entre a sexta-feira 17 de Julho e a segunda-feira 20 de Julho.
O Plano Nacional de Resíduos Sólidos de 2010 classifica os resíduos sólidos (lixo) em doze categorias: domiciliares, de limpeza urbana, urbanos, de estabelecimentos comerciais e de prestadores de serviço, de saneamento básico, industriais, de serviços de saúde, de construção civil, agrossilvopastoris, de serviços de transporte, minerais e perigosos. Esta classificação está definida no 13º. Artigo do plano. Pois bem, mais adiante o 20º. Artigo trata da questão do plano de gerenciamento dos resíduos sólidos e é explícito em adiantar que a competência da maioria deste tipo de resíduos é de seu gerador ou por coordenação de órgão federal competente, como nos casos dos resíduos hospitalares, industriais ou minerais. Os dois únicos tipos de resíduos que são de competência exclusiva do menor órgão executivo da União, que são as prefeituras municipais, são os resíduos domiciliares e os gerados por limpeza urbana. Só que a limpeza urbana a que se refere é aquela que trata dos resíduos mínimos gerados nas ruas, que incluem desde dejetos vegetais e animais (folhas, galhos menores, animais mortos acidentalmente, etc.) até o lixo cotidiano que imprudentemente é jogado em espaço público. Mas não entulho. Entulho é lixo urbano de competência de seu gerador. Podemos até cobrar da prefeitura local adequado para colocar o entulho. Mas seu transporte até o destino é responsabilidade do gerador.
Isso não é invenção recente. Procure saber a legislação das cidades ao redor do Capão do Leão sobre esta questão. Se quiser, pesquise também em outras cidades e estados. Envie um e-mail para cada capital de cada estado brasileiro perguntando sobre o assunto. Garanto que as respostas irão corroborar aquilo que estou tentando explicar.
Se você coloca o seu lixo doméstico direitinho nos dias de coleta defronte à sua casa, você está fazendo certo. Se o sistema de recolhimento de lixo da prefeitura não estiver funcionando normalmente, ponha a boca no mundo, critique e xingue. Mas não deposite seu lixo em esquinas, valetas ou terrenos baldios e espere que a prefeitura tenha a suprema obrigação de recolher. Por questão de higiene pública, até deve fazer isso. Porém, em contrapartida, responsabilizar quem faz isso e fazer doer no bolso – que normalmente costuma ser o melhor educador nestes casos.
Para finalizar, ninguém pense que acredito que o poder público municipal seja uma maravilha e que ele cumpre religiosamente suas obrigações. Devemos sim cobrar a trafegabilidade das ruas, a limpeza das valetas ou sua substituição por tubos, a abertura de vias de vazão d’água, uma infra-estrutura urbana melhor. Certamente! Mas retornando aquilo que expressei no meio deste artigo – “Dai a César, o que é de César!”. Isto é, vamos pleitear aquilo que é de direito, mas não esqueçamos enquanto cidadãos nossas responsabilidades.

*Joaquim Dias é professor da rede pública de ensino, pesquisador e historiador de nosso município. É editor do blog Capão do Leão História e Cultura. Atualmente é vice-presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Capão do Leão (IHGCL).
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